Assistimos à generalização da contratualização a prazo para funções permanentes, à vulgarização dos recibos verdes, ao crescimento do negócio das empresas de trabalho temporário, à transformação dos/as trabalhadores/as em “colaboradores/as”, sempre disponíveis e descartáveis.
O trabalho a recibos verdes é disso um bom exemplo: estima-se que existam hoje em Portugal cerca de 900 mil falsos recibos verdes, a desempenhar funções permanentes, com horário, local de trabalho e hierarquia reconhecíveis, mas sem qualquer contrato ou reconhecimento de direitos.
O Estado, que deveria ter uma responsabilidade especial nesta matéria - desde logo fiscalizando e impedindo esta chantagem ilegal sobre um conjunto cada vez maior de trabalhadores/as -, é o primeiro a não dar o exemplo: além dos meios insuficientes fornecidos à Autoridade para as Condições do Trabalho, há já hoje mais de 100 mil pessoas a trabalhar com vínculos precários em funções públicas.
A Segurança Social, uma conquista histórica e social que deveria garantir a solidariedade entre gerações e assegurar o apoio a todos/as em situação de vulnerabilidade, exclui hoje um número crescente de trabalhadores/as. Os/as trabalhadores/as sujeitos/as à ilegalidade dos falsos recibos verdes, quase sempre com baixos salários, contribuem para a Segurança Social, mas quase sem contrapartidas.
É neste contexto que muitas vezes estes/as trabalhadores/as têm de escolher entre cumprir com as suas contribuições para a Segurança Social ou fazer face às dificuldades do quotidiano.
Assim, há hoje milhares de trabalhadores/as a recibos verdes que viram acumular-se uma dívida à Segurança Social, que, nas suas condições, não conseguem saldar. Uma dívida quase sempre contraída numa situação que, além de injusta, é ilegal. É uma dívida contraída porque os patrões não descontaram o que deveriam, se a esse trabalho correspondesse o contrato de trabalho devido; é uma dívida contraída por milhares de pessoas que nunca tiveram direito aos subsídios de férias ou de Natal; é uma dívida contraída por pessoas que, por serem cinicamente consideradas empresários/as, nunca tiveram apoio na doença ou no desemprego.
A Segurança Social é uma conquista que não queremos perder. Queremos defendê-la, para que ela seja uma garantia solidária que nos proteja nas dificuldades e nos dê segurança quando olhamos para o presente e o futuro. Sabemos que os sucessivos Governos a têm vindo a esvaziar e afirmamos que nos bateremos por ela e pelo seu aprofundamento, capacidade e dotação. Uma sociedade com direitos no trabalho e na vida não pode dispensar uma Segurança Social forte e universal.
É por isso que dizemos que, quando olhamos para as dívidas destes/as trabalhadores/as à Segurança Social, se têm de fazer contas. O Estado permitiu a instalação confortável do abuso e da ilegalidade nas relações laborais. Não pode agora executar cegamente estas dívidas.
Assim, porque queremos uma Segurança Social forte, a que corresponda uma sociedade com direitos no trabalho e na vida, e porque não aceitamos que seja a própria Segurança Social a tornar-se uma forma de chantagem para os/as trabalhadores/as, exigimos que as dívidas contraídas por estes/as trabalhadores/as não possam ser executadas sem que sejam averiguadas as condições nas quais elas foram contraídas. Fazer as contas tem de ser um momento esclarecedor e rigoroso: a dívida daqueles/as a quem são devidos direitos há anos, tem que ser equacionada mediante a avaliação da responsabilidade dos que lucraram com a sobre-exploração do seu trabalho.
Esta proposta é incontornável na medida em que identifica (e pretende resolver) uma perversão no modo como se usa e abusa da legislação que autoriza a existência dos recibos verdes, que tem vindo a ser utilizada por um número cada vez maior de entidades empregadoras. O Estado tem que falar e terminar com as ilegalidades e injustiças a que se têm de sujeitar cada vez mais pessoas, desde logo na Segurança Social. Por isso, afirmamos: antes da dívida, temos direitos!
Festa de lançamento da Petição à Assembleia da República
É preciso agir perante as injustiças que a precariedade nos impõe. Foi isso que levou estes 4 movimentos - APRE! (Activistas Precários), FERVE (Fartos/as d'Estes Recibos Verdes), Plataforma dos Intermitentes do Espectáculo e do Audiovisual e Precários Inflexíveis - a juntarem-se para promover uma petição à Assembleia da República, que reunirá milhares de assinaturas para combater as injustiças nas contribuições para a Segurança Social dos trabalhadores e trabalhadoras a recibo verde. Essa petição será lançada num convívio mobilizador no próximo dia 20, no espaço Interpress, no Bairro Alto, em Lisboa. Esperamos por ti lá.retirado de: http://antesdadividatemosdireitos.blogspot.com/
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