segunda-feira, 9 de novembro de 2009

Utopia XXI - Anarquia - Ideologia vs Método - Parte II



Continuando do post anterior


VI. Vale Tudo?


Será que a rejeição anarquista da Verdade significa que o anarquismo é: vale tudo!? Sim e não, aquilo que destrói a autoridade ilegítima é anarquista, aquilo que não o faz, não é. Esta é a base para a metedologia, e para a resistência para com os priveligiados e os poderosos. Significa que apenas a autoridade legítima é aquela que é livremente aceite, na completa ausência de coerção. Isto permite uma extraordinária variação de actividades humanas, e cria a aparência de "qualquer coisa dá" (anarquia) mas isto só poderá ser realizado através de organizações consistentes e dedicadas formada por membros da sociedade.
Desta maneira, rejeitam-se estilos de vida, porque o que eles pretendem alcançar ( a autonomia narcisítica) é impossível na nossa sociedade feita de interligações, e não é anarca, pois não considera a luta de classes e a organização, em favor de egoísmos e abandono da solidariedade humana. A base metedológica para a rejeição é de que não liberta ninguém, incluindo o indivíduo que possui esses hábitos de vida, e assim não é de maneira nenhuma uma ameaça para com a autoridade ilegítima. A "Zona Autónoma Provisória" é uma bomba sem rastilho, pois deixa a principal origem de opressão (o Estado) ileso, intacto e incontestado. É o método errado, ainda que o desprezo pelas ideologias desse indivíduo esteja bem fundado. Os anarquistas sociais deverão deixá-los sozinhos com os seus hábitos, ao invés de discutirem com eles. Para o anarquista social, o objectivo é organizar-se eficazmente em vez de exercerem liricismos com os indivíduos do modo de vida anárquico. O Anarquismo é uma teoria racional e uma filosofia, que requer observação e pensamento, e principalmente organização e acção.


VII. Anarquistas indutivos e anarquistas deductivos


Ainda que no tópico da razão e da racionalidade, há algo que distingue o Anarquista ideólogo do Anarquista metedológico, nomeadamente a dedução contra a indução. Sendo que, a dedução é quando partimos de uma premissa. Por exemplo, se disser: "Sou um Anarquista, logo tudo o que faço é anarquista" Sou dedutivo na afirmação das minhas acções serem anarquistas. Se disseres algo que eu faça que não é anarquista terei que discordar por essa razão, diria "não, estás errado, porque eu sou Anarquista, e o anarquismo é o que eu faço". E já que discordam de mim, e eu sou um Anarquista, então deves ser um autoritário, logo és meu inimigo. Vêem o problema? Este género de ideologia dedutiva não está limitada aos ANARQUISTAS, pois é bastante comum a todas as ideologias autoritárias que por aí ‘andam’, nas quais as pessoas não fazem o que afirmam. Porém, com o anarquismo, este modo de pensar é positivamente mortífero, pois opõe-se à liberdade de pensamento e bloqueia a mente. O anarquismo indutivo, todavia, considera o que fazemos e porquê, e conclui que és um anarquista baseado no que tu fazes, não no que tu dizes. Nem todos os que combatem a autoridade ilegítima são anarquistas, como é óbvio. Assim, o anarquismo indutivo quer dizer é que as acções de alguém são o critério para ser anarquista, não as alegações de alguém.
Isto é uma distinção muito importante, pois permite-nos estar em guarda contra os autoritarismos latentes e os vanguardismos dentro do próprio movimento. Isso foi o que notou Bakunine quando confrontou Marx. Marx e os seus defendiam que eram pelo socialismo, e pretendiam que todos abraçassem esse seu programa como a "melhor" maneira de chegar ao socialismo, mesmo que o seu programa provasse (como aconteceu) que minava e destruía o socialismo a que aspirava. Os mesmos riscos existem com o Anarquismo. Onde o anarquismo dedutivo pode ser encabeçado por oportunistas autoritários dentro do movimento, (e dificilmente serão contestadas porque tais acções desencorajam os dissidentes e a discussão a favor da conformidade ideológica), o que significa que tais oportunistas não serão contestados nos seus próprios grupos!
O anarquismo inductivo ou metedológico, no entanto, não podem ser tão facilmente atraiçoado, pois ele envolve toda a discussão possível e diz que a cada um cabe dar a sua decisão sobre determinado assunto, ao invés de esperar por alguém que nos "ajude". Significa pensar por si próprio ao invés de deixares outros pensarem por ti. Os anarquistas dedutivos amam os manifestos e as plataformas base, tratados e doutrinas que eles constroem e esperam que aprendas, memorizes e obedeças. Eles sustentam que se conseguissem converter suficientes indivíduos à SUA maneira de pensar então a anarquia seria possível. Eles sustentam que tu ainda não estás preparado. Os anarquistas indutivos pensam que isso é ridículo, defendem que nenhum tratado ou manifesto pode legitimamente abranger todos os sonhos humanos, esperanças, e aspirações. Depois, defendem que o cidadão comum já está preparado para receber as ideias anarquistas, e aplicá-las à prática, sendo que eles ganham esta nossa esperança apenas pela virtude de serem humanos.
Os humanos não gostam que lhes digam o que fazer ou que sejam arrumados a um canto. Se gostassem, os que estão no poder não gastariam tanto tempo, dinheiro e energia tentando fazendo-nos acreditar que somos livres quando, de facto, não os somos. O papel do anarquista nisto tudo é apenas servir de "despertador social" no início, e comunicar os métodos de organização que enfraqueçam e destruam a autoridade e deixar que o processo se desenvolva por si. O ANARQUISTA, ao contrário, pretende um papel mais activo, mais vanguardista, já que defendem que apenas a sua tribo pode ter a responsabilidade de serem os mais sérios e esclarecidos, de possuirem a Verdade que apenas eles podem ver; vêem-se a si próprios como os mestres que orientam tudo para melhor atrás do palco, já que as marionetes não podem ser confiadas ao ponto de desenvolverem a revolução.
Esta atitude é o porquê da esquerda radical tantas vezes caracteriza a classe trabalhadora como apática, reaccionária, racista, sexista e homofóbica . Vêem-nos como seres menores que necessitam de liderança e instruções. Um anarquista, pensa que tal atitude é insana, pessoas endoutrinadas não são pessoas livres, e é impossível criar uma sociedade livre (isto é, anarquista) usando métodos não livres.


VIII. Então e depois?


Depois, é que só importam duas coisas:

1) organizar solidariedade entre os trabalhadores;
2) fomentar a acção popular directa.

Esse é o objectivo dos anarquistas, ou deveria ser. Não intenção do anarquista ensinar aos outros como se comportarem ou o que pensarem, isso é assunto deles.
O ANARQUISTA sustenta que "ao menos se o resto do mundo fosse um ANARQUISTA (como eu) tudo estaria perfeito", vêem-se a si próprios como o somatório total da pureza anarquista, mas isso é um sentimento vanguardista levado ao extremo, e é Marxista de raiz e de efeitos. A metedologia do anarquismo é mais fundamental, pois é relativamente fácil de determinar se estás a sê-lo ou não , enquanto que palavras e doutrinas são ocas e vazias de significado, elas podem ser interpretadas quase como quisermos ao ponto de parecerem doces, acolhedoras e verdadeiras. Todos os inimigos da liberdade o fazem, por exemplo os EUA bombardeiam pessoas e assassinam líderes democraticamente eleitos em nome da "democracia" e da "liberdade" , uma ideia que apenas ganha forma se abraçares a ideologia da América, em vez da metedologia da democracia!! De facto, se examinarmos o sistema governamental dos EUA metedologicamente veremos que nem de perto nem de longe se assemelha a "democracia" , "liberdade", "vontade popular" ou "representação", mas todas estas palavras são usadas até à náusea pelas elites que estão no poder. Lenine, enquanto tentava amealhar mais apoios para os Bolcheviques, fez de "todo o poder para os sovietes" o slogan do seu partido, sabendo que a autogestão popular era pretendida pelos trabalhadores. Os trabalhadores depositaram a sua confiança em Lenine e Trotsky para o fazer, e, para surpresa sua, quando os Bolcheviques chegaram ao poder, engrenaram uma diferente mudança e destruiram tantos sovietes quanto puderam, do "todo o poder para os sovietes" passou-se para "todo o poder para os Bolcheviques" (o que era o Estado, na altura). O Partido "Comunista" destruiu o comunismo, pois este ameaçava o seu poder base! O trabalho do anarquista é somente mostrar os métodos e as maneiras pela qual a revolução libertária social pode ser feita. E esta estratégia é mais anarquista do que a outra, porque deixa a iniciativa onde ela deve estar: na rua, nas lojas, nas salas de aula, milhares de arenas de combate onde os indivíduos se juntam para banir a autoridade ilegítima.

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